Hoje você conhecerá Ted, caso típico de masoquista, que queria usar a hipnose para descobrir uma traição.
Infelizmente, esse e outros mitos da hipnose ainda não foram completamente esclarecidos.
Hipnose para descobrir traição
Ted, um homem de quase 50 anos, cabelos grisalhos, usando terno azul e uma bela gravata, igualmente azul, entra em meu consultório com uma expressão tenebrosa.
– Posso te chamar de doutor? – Ele pergunta com um tom respeitoso.
– Não, não. Não tenho doutorado, nem sou médico. Apenas me chame de Rafael – respondo de forma natural, já que é comum as pessoas me perguntarem a mesma coisa -.
– Então, Rafael, quero que você hipnotize minha esposa. Quero esclarecer uma coisa.
– Sua esposa? Como assim?
– Bem, Rafael. Tempos atrás eu tive que viajar a trabalho e, desde então, minha esposa está diferente comigo. Eu tenho certeza que ela me traiu, mas não quer assumir isso, de jeito algum.
– E de onde você tirou essa ideia?
– É minha intuição que diz isso. Tenho certeza que ela me traiu com alguém e não quer assumir o erro. E isso está me destruindo.
A necessidade de sofrer
Freud, no livro “Três ensaios sobre a teoria da sexualidade”, informa que passou a usar o termo masoquismo por sugestão do psiquiatra Krafft-Ebing, pois esse termo, extraído da literatura de Sacher-Masoch, indica não só o prazer na dor, mas também o prazer obtido em qualquer forma de sujeição ou humilhação.
Porém, precisamos entender exatamente o que significa prazer, na frase acima.
O masoquista não é a pessoa que “gosta” de sofrer, no mesmo sentido de dizer que “gostamos de chocolate”.
Não.
O masoquista é, na verdade, uma pessoa condicionada à necessidade de sofrer.
O masoquista irá racionalizar este condicionamento com frases assim:
“Sucesso sem sofrimento não vale nada”
“Só encontro pessoas que não prestam”
“Eu sempre acho que algo errado vai acontecer”
“Eu sempre preciso de alguém que me ‘puxe’ para sair do lugar”
Todo masoquista é alguém que, por grande parte da sua vida, principalmente na infância, habituou-se a fracassar e até mesmo receber atenção – mesmo que dolorosa – através deste fracasso.
Assim, a criança que sempre fracassava, e no final ganhava um “ai, tadinho!” da mamãe, tem a mesma possibilidade de ser um masoquista assim como outra criança que só recebia o olhar do papai quando este dizia “seu pirralho estúpido!”.
O masoquista não se sente confortável quando as coisas estão indo bem, já que ele espera “algo terrível” (como o olhar punitivo do papai) ou acha que “não deve ser assim” (pois aprendeu que era um fracassado e, portanto, ter sucesso é algo errado).
Ele está sempre procurando por problemas. Se não encontra um, o cria.
Ele piora tudo, e sua biografia seria a de uma pessoa destinada ao fracasso.
Assim, não é que o masoquista “gosta” da dor.
Ele apenas não consegue ficar sem isso.
Quem precisava da terapia?
Ted não apenas estava convencido de que sua esposa o traíra, como também tinha certeza de que ela havia feito isso várias vezes ao longo dos anos.
Ao ser indagado sobre pistas e coisas reais, ele simplesmente negava e, em seguida, afirmava que sua “intuição” nunca falhava.
Tentei explicar que não era possível usar a hipnose para “descobrir segredos” das pessoas, pois hipnose é apenas uma imaginação guiada, e não um poder que o hipnotista exerce sobre alguém.
Porém, ele agora estava ainda mais ríspido, exigindo então que eu conversasse com sua esposa.
Tive que ser ainda mais firme, pois como terapeuta não posso ser um “interrogador” ou “intermediador” entre as pessoas.
Disse-lhe que este era um caso onde eles deveriam conversar e chegar a um consenso, e que eu, como hipnoterapeuta, poderia ajudá-lo a trabalhar toda esta confusão e medo que lhe cercavam a cabeça.
– Eu cansei de vocês, terapeutas! – Ted esbravejou em tom rude.
– Como assim? O que foi? – Perguntei assustado com sua mudança de comportamento.
– Passei cinco anos fazendo sessões de análise semanal. Já sei tudo o que tenho que saber da minha infância e não quero mais perder meu tempo. Você vai me ajudar ou não?
– Se seu objetivo é “descobrir” uma traição com a hipnose, infelizmente não posso. Só posso lhe ajudar a entender o porquê de tomar estas atitudes que o fazem sofrer (pensei que ele ia bater em mim nessa hora).
Ele suspirou profundamente. Disse que era o que precisava saber, e foi embora.
Algumas pessoas simplesmente não estão prontas para fazerem uma mudança em suas vidas.
Nunca mais o vi, e tudo o que sei é que ele foi em uma sessão de “constelação familiar” onde “descobriu” que sua mãe traiu seu pai.
Como ele usou isso para resolver seu problema emocional ou seu casamento, nunca vou saber.
Reflexão
A história do Ted é muito comum.
Não no sentido de “achar” que foi traído, mas na necessidade de encontrar problemas e ficar sofrendo à toa, mesmo sabendo o que pode fazer para resolver o problema.
É comum também as pessoas acharem que um terapeuta, principalmente um hipnoterapeuta, é uma pessoa que estala os dedos e pronto, tudo está resolvido no universo.
Só que não!
Terapia é, antes de tudo, ter a coragem de fazer o que tem que ser feito.
Porém, nem todos estão prontos para pagar este preço, e preferem ficar esperando algum milagre ou milagreiro.
Você faz parte do grupo das pessoas que “espera” a mudança, mesmo sabendo que ela pode não vir?
Ou você toma jeito e muda, sem perder tempo?
Não há resposta errada. Você só precisa entender que para tudo há uma consequência.
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